Type O Negative Bloody Kisses: A História Da Última Banda De Goth-Metal

O Type O Negative foi uma das histórias de sucesso mais improváveis numa década de histórias de sucesso improváveis. Liderados pelo imponente Peter Steele: um gigante de mais de dois metros de altura, com uma voz penetrantemente profunda e um sentido de humor obsidiano, o quarteto do Brooklyn mesclou o espírito profano do Black Sabbath com a grandiosidade gótica do The Sisters Of Mercy. O seu ‘magnum opus’ foi Bloody Kisses (1993), um grimório de romance, fúria, ironia e tristeza que vendeu um milhão de cópias e, inesperadamente, lançou o goth-metal para o mainstream.

Ninguém viu como aconteceu. Alguns anos antes, Steele era baixista/vocalista do Carnivore, uma banda cujo som primitivo, propensão a figurinos de estilo bárbaro e opinião deliberadamente provocativa sobre questões sociais (por exemplo Race War) confundiam tanto o público metal quanto o hardcore.

“Peter gostava de sacanear as pessoas”, disse o baterista original do Type O Negative, Sal Abruscato. “As pessoas pensavam que ele estava falando sério quando estava brincando, e brincando quando estava falando sério”.

Depois que o Carnivore acabou em 1988, Peter decidiu formar uma nova banda que combinaria com uma inesperada camada de eletrônica, cortesia de seu velho amigo, o tecladista Josh Silver. Entre nomes como Subzero, Zero Tolerance e Repulsion, finalmente adotaram Type O Negative, que é uma expressão que refletia a sua perspectiva sombria.

Os dois primeiros álbuns da banda: Slow, Deep and Hard (1991) e The Origin of the Feces (1992), mantiveram um pé na cena hardcore, mas pontuaram tudo com uma atmosfera crepuscular.

“O Peter adorava garotas góticas”, disse Sal. “Costumávamos ir aos bares onde elas iam para encontrá-las. Ele gostava muito desse som – The Sisters Of Mercy [os pioneiros industriais de Nova Iorque], Swans [a banda britânica de shoegaze] e My Bloody Valentine. Toda a cena era atraente para ele, então ele acabou criando a sua”.

Quando a banda começou a trabalhar em Bloody Kisses, os elementos góticos da música do Type O foram realçados. E essa não foi a única mudança.

“Peter decidiu que a melodia estava onde tinha de estar”, falou o guitarrista Kenny Hickey. “O que era uma coisa difícil de fazer. Ele passou de berrar a escrever aquelas letras furiosas e raivosas para tentar cantar pela primeira vez em sua carreira”.

Os dois primeiros singles do álbum posicionaram o grupo na vanguarda da cena gótica inexistente. Black No.1 (Little Miss Scare-All) era uma ode sarcástica de 11 minutos a uma namorada que tinha enganado o vocalista, além disso, veio com aquele toque de Família Addams.

Foi seguido de Christian Woman, oito minutos de erotismo quase religioso, onde tinha Steele entoando a frase: “Jesus Christ looks like me [Jesus Cristo se parece comigo]”. Surpreendentemente, uma versão editada dela se tornou um sucesso nas rádios norte-americanas, o que ajudou Bloody Kisses a ganhar disco de ouro e platina nos EUA. Aquela cena inexistente de goth-metal foi de repente transformada numa vida.

“Todo o fascínio pelos vampiros se relacionou com as pessoas”, comentou Sal. “Foi na época do filme Interview with the Vampire [Entrevista com o Vampiro], e tudo explodiu depois disso. Eu lembro que tinha uma loja em East Village que começou a vender camisas rendadas, casacos de veludo e coisas assim. A banda logo começou a atrair muitas fãs por causa disso”.

O shows começaram ser maiores – e mais estranhos. A certa altura, a banda foi contratada para tocar num clube em Nova Iorque que era uma masmorra sexual. “Era um clube de BDSM [Bondage, Disciplina, Dominação, Submissão, Sadismo e Masoquismo] underground com todo aquele equipamento de tortura”, relembrou Sal. “Havia pessoas usando coleiras. Estávamos tipo: ‘O que estamos fazendo nesta porra?’ Éramos apenas quatro caras do Brooklyn, não estávamos acostumados com aquele estilo de vida”.

A música dos Type O Negative não era apenas um pandemônio projetado para góticos e fetichistas. Duas faixas de Bloody Kisses: a pesada Kill All the White People e We Hate Everyone lembravam o passado hardcore-metal da banda. A última abordava acusações de racismo que atormentaram os músicos em seus primeiros dias, uma ressaca do tempo que Peter esteve no Carnivore. “A certa altura, na Europa, fomos acusados de nazismo”, relembrou Kenny. “Fala sério, Josh Silver é judeu”.

O senso de humor do Type O Negative pode não ter agradado a todos, mas era uma parte importante do DNA da banda. Estava no título Black No.1 – o hino épico ao condenado amor gótico foi batizado a partir de uma tonalidade de tinta para cabelo. E também estava no apelido Drab Four, uma referência aos Beatles, que era adorado por Peter Steele.

Mas com a mesma frequência, a ironia e o sarcasmo mascaravam uma alma perturbada. A cover fúnebre da suave Summer Breeze, do Seals & Crofts, até podia parecer uma paródia, mas Peter investiu nela uma ânsia e genuína dor.

“Peter era um tipo muito doce e muito engraçado, mas também era muito frágil”, ressaltou Sal, que deixou a banda após o lançamento de Bloody Kisses. “E essa vulnerabilidade permitiu que alguns demônios aparecessem”.

Os demônios do vocalista assumiram a forma de álcool e, principalmente, cocaína. Passou a década seguinte lutando contra o vício e a depressão – algo que expôs no sombrio quinto álbum da banda, World Coming Down, de 1999.

Naquele época, vários outros grupos tinham se sintonizado na onda do Type O…, entre eles HIM, Lacuna Coil, Moonspell e os veteranos finlandeses do The 69 Eyes, que tinham mudado de uma versão metaleira vestindo lycra aos olhos negros do goth-metal.

“Consigo ouvir o legado do Type O Negative em muitas bandas hoje em dia”, enfatizou Kenny Hickey. “Especialmente em muitas bandas de metal europeu. O único problema é que agora toda essa gente pensa que sou um druida, ou um vampiro lobisomem. Fala sério, sou um cara [com mais de 50 anos] do Brooklyn. Não sou um vampiro”.

Infelizmente, Peter Steele já não está mais aqui para curtir o legado da banda que fundou. Em 2005, a sua família realizou uma intervenção e o vocalista foi internado numa clínica psiquiátrica, resultado do seu abuso em substâncias pesadas.

Também passou 30 dias na prisão de Riker’s Island, em Nova Iorque, por agressão. Mas, posteriormente, ele saiu de Nova Iorque parecendo mudar a sua vida e querendo se reabilitar. No entanto, no dia 14 de abril de 2010, morreu vítima de um aneurisma da aorta. Tinha apenas 48 anos.

“Se ele tivesse ido ao médico regularmente, talvez ainda estivesse vivo”, ressaltou Sal Abruscato. “Mas aquela não era uma pessoa que ia ao médico. E quem quer que estivesse perto dele não se importou o suficiente para dizer: ‘Ei, vá ao médico, veja como você está’. Mas após todos aqueles anos de abuso, talvez fosse tarde demais”.

O Type O Negative se dissolveu depois da morte do líder. Josh Silver deixou a indústria musical e se requalificou como paramédico (hoje em dia recusa todas as entrevistas, incluindo esta). Kenny Hickey se concentrou no seu agora extinto projeto Seventh Void antes de formar a nova banda Silvertomb, em 2017. Sal Abruscato se juntou ao Life Of Agony após a sua saída de Type O Negative e atualmente lidera o A Pale Horse Named Death, cujo goth-metal faz lembrar a sua antiga banda. Ambos insistem que não há planos para ressuscitar Type O Negative de forma alguma.

“Sei que algumas pessoas dizem ‘nunca diga nunca’, mas seria desrespeitoso”, disse Sal. “Nunca ninguém vai soar como o Peter. Acho que Type O Negative morreu com ele”.

Por Dave Everley
Fonte: Metal Hammer

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