Sepultura não é uma banda em estado vegetativo e provou isto aos fãs cariocas

A relação entre o Sepultura e a cidade do Rio de Janeiro quase se aproxima dos quarenta anos – duração maior do que a de muitos casamentos por aí -, visto que o primeiro show do grupo mineiro na capital fluminense aconteceu nos idos de 1986, época em que o quarteto divulgava o debute Morbid Visions. Desde então, a banda se tornou figura presente na cena carioca, mostrando todo o poderio de seu repertório thrash e death metal.

Mesmo assim, o grupo estava devendo aos cariocas e fluminenses um show completo, profundo no fantástico mundo do Sepultura, uma vez que os últimos espetáculos foram sob a égide do Rock in Rio, portanto, foram concertos curtos e sem todos os aparatos de palco que o quarteto pode oferecer.

O teor do novo show na Cidade Maravilha foi a celebração das quatro décadas de bons serviços prestados aos heavy metal, que vem embalada sob o bem sacado nome Celebrating Life Through Death. Longe de ser um baile da saudade como muitas bandas o fazem em suas turnês de despedida, o expediente proposto pelo Sepultura é o oposto, pois a ideia é comemorar apresentando o suprassumo do passado e do presente.

Com meia hora de atraso, precisamente às 20h:30, Andreas Kisser (guitarra), Paulo Xisto Jr. (baixo), Derrick Green (vocal) e Greyson Nekrutman (bateria) subiram no palco da Farmasi Arena para duas horas de porrada na orelha.

Sem um pingo de dó e piedade, o trio infernal composto pelos pesos-pesados Refuse/Resist, Territory e Propaganda, cortesia da obra-prima Chaos A.D., firmou os parâmetros da noite: intensidade musical vinda do quarteto e devolvida na mesma moeda pelos milhares de fãs que se acotovelavam para ficar o mais próximo da grade.

Foto: Livia Teles

Deste ponto em diante, o Sepultura brincou com o fator tempo, visto que resgatava temas oitentistas como Inner Self, do intenso Beneath the Remains, e contrapunha com sons atuais tal qual Means to an End, do sofisticado Quadra.

Para quem cisma em vociferar que o apogeu do Sepultura está encapsulado nos anos 90, claramente não tem olhos de ver e ouvidos de ouvir – ou é apenas um boçal que não sai de casa e adora chafurdar-se no lamaçal das redes sociais para falar coisas sem pé e cabeça -, uma vez que é impossível não perceber a grandeza do vigente momento e formação do grupo.

Até mesmo temas lá do fundo baú como Escape to the Void e Troops of Doom ganharam contornos mais técnicos, contudo, não deixaram o fator ofensivo arrefecer. É a união dos dois mundos, o que não havia, pois, nos primórdios do conjunto.

Foto: Livia Teles

Ter uma discografia com quinze registros de estúdio não é para qualquer banda, não; além disso, significa que há muita coisa boa à disposição, com isso, o quarteto tem feito uma interessante danças das cadeiras no repertório. Vamos ao exemplo prático! Na primeira perna da tour, o grupo sacou sons como Sepulnation e Cut-Throat; agora, no entanto, foi a vez de Dead Embryonic Cells e Spit vislumbrarem a luz do Sol e ajudarem no pandemônio musical.

Pode parecer supérfluo para uns ou trivial para outros, mas uma produção de palco bastante caprichada colabora para uma imersão no concerto e para um quê contemplativo enquanto o caos sonoro castiga os ouvidos. E o Sepultura é uma das poucas bandas nacionais com tal zelo pela própria arte e pelo público pagante. Jogos de luzes e imagens no telão em perfeita sintonia às canções intensificaram o elo entre a banda e o público e complementaram a experiência sonora.

O slogan Sepultura do Brasil sempre ganha mais pujança ao som de Kaiowas e Ratamahatta e dessa vez não fora diferente. Vale ressaltar que a performance de Ratamahatta ficou ainda mais especial porque contou com a participação de Fred Castro (ex-Raimundos) e um dos filhos de Carlinhos Brown na percussão.

Foto: Livia Teles

A obra mais hermética do Sepultura fora bem representada por Phantom Self, do quase progressivo Machine Messiah, e Agony of Defeat e Guardians of Earth do potente Quadra.

Já Arise fora a trilha sonora para um dos maiores mosh pits da noite – três indivíduos da equipe de segurança da casa tentaram se meter e colocar ordem no pit, mas foram plenamente engolidos pelo vórtice mortal. Provavelmente precisaram dar aquela passadinha no posto médico e ver se não estava faltando nenhum pedaço.

Roots Bloody Roots foi o ponto final da celebração dos quarenta anos do Sepultura na capital fluminense. É lógico que muitos sons ficaram de fora da festa, visto que o quarteto precisaria de mais duas horas de espetáculo para dar holofote a muitos outros clássicos.

A certeza que ficou para todos os fãs que curtiram o arrasta-pé metal é que o Sepultura está encerrando carreira em alta, ou seja, não é uma banda em estado vegetativo e isto foi mais do que provado aos cariocas na noite do último sábado.

Foto: Livia Teles
Foto: Livia Teles

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