Há um bom tempo atrás se perguntasse a um fã brasileiro de música pesada quais as bandas formam o time de elite do metal nacional, a resposta era previsível e de certa forma mecânica.
Poucas peças mexiam no tabuleiro e sempre passava a sensação que nada valeria atenção se não viesse daquele seleto clube. Pois o tempo passou e é certo que o mercado evoluiu junto. Inúmeras bandas ganharam vida, e principalmente, tomaram corpo para provar que dá para tirar muito caldo da prata da casa.
Com quinze anos de estrada, seis discos de estúdio, turnês internacionais e com a aprovação dos melhores veículos de imprensa voltados à música, a Hangar é peça fundamental nas engrenagens da cena metálica brasileira, e seu líder, o baterista Aquiles Priester, não só comanda de perto cada passo da banda, como também é um dos instrumentistas responsáveis em trazer holofotes internacionais ao Brasil.
Então ninguém melhor do que o próprio Aquiles Priester para nos falar a quanto anda sua carreira dentro e fora do Hangar; sua experiência com a banda Dream Theater e a sensação de ser eleito o quinto melhor baterista do mundo, segundo a revista Modern Drummer Readers Poll.
Portanto, chega de nove horas porque a palavra é do Aquiles.
O vocalista, André leite, é o quarto vocalista a integrar a banda. Você acredita que essa rotatividade no posto se deva qual (quais) fator (s)?
Aquiles Priester: Com certeza por causa das expectativas das pessoas que entram na banda. Por mais que a gente fale que para manter uma banda de metal no Brasil a gente precisa realmente trabalhar muito duro e ficar muito tempo fora de casa, ninguém acredita, até que a pessoa comece a viver esse cotidiano.
No entanto, acho que as composições do Hangar são muito fortes e significam muito para os nossos fãs. Por sorte da banda, os principais compositores não são os vocalistas. Mas com certeza todos têm extrema importância na hora de interpretar as letras e linhas melódicas que eu crio.
E os fãs, como reagem a essas trocas de cantores, visto que cada um tem sua personalidade e particular forma de se comunicar com plateia?
Aquiles: Eu sempre falo que nenhum integrante nunca foi tirado do Hangar, eles que decidem sair. Quando optamos por alguém é por que acreditamos que ele seja a pessoa certa, e muitas vezes o tempo mostra que não é. Os outros 4 integrantes (Mello, Martinez, Laguna e Eu), somos os principais compositores e estamos juntos há mais de 12 anos.
Nós temos uma forte ligação de amizade e o comprometimento com a banda. Logo, os fãs precisam entender que nós vamos com um integrante até onde ele quer ir, depois disso, quando ele sai da banda, nós temos a opção de acabar com a banda ou continuar…nós sempre continuamos.
O posto é, hoje, ocupado por, André Leite, que teve de cara a tarefa nada fácil de registrar sua voz no disco, Acoustic, But Plugged In!, já que o formato exige uma carga emocional ainda maior e pelo fato das canções terem sido registradas por outros vocalistas, sendo apenas a canção “Haunted By Your Ghosts” inédita. Como você avalia o trabalho do cantor e o quê ele pôde agregar às músicas?
Aquiles: O André reinterpretou linhas que já existiam nos nossos discos e por isso é mais fácil do que criar coisas novas. O timbre do André caiu muito bem no formato do disco acústico e ele teve muita facilidade de assimilar as variações que criei no estúdio para formatar melhor o disco acústico.
A “Haunted” é um estilo de música que há muito tempo eu queria compor, mas nunca tivemos a chance por que os nossos discos sempre foram muito pesados.
A música veio na hora certa e quando mostrei a ideia do refrão (que foi a primeira coisa que foi composta), a galera gostou de cara e aí o Théo Vieira veio e acrescentou os detalhes que precisávamos. É uma grande parceria da banda.
Os álbuns do Hangar sempre foram produzidos por você, Aquiles. Há coprodução de outros profissionais como Theo Vieira e Heros Trench, mas como via de regra o trabalho é sob sua direção. Já considerou deixar as produções futuras sob os cuidados de outros profissionais? Se sim, qual você cogitaria ao posto de produtor?
Aquiles: Ainda não apareceu a oportunidade. E sempre precisamos levar em conta que a produção com um nome expressivo custa muito dinheiro e às vezes o direcionamento não é aquilo que você esperava. Ainda acredito que são os olhos do dono que engordam o gado e por isso nós cuidamos de tudo no Hangar.
Vi que você foi além de produzir Acoustic, But Plugged In!, sendo o responsável pelo conceito da capa do disco – com direção de arte Vanessa Dol. As capas sempre exerceram certo fascínio para o público rock ‘n’ roll, mas em tempos atuais onde o álbum, artigo físico, é quase feito em exclusividade para colecionadores, a responsabilidade de uma boa direção de arte é um fator depondo a favor da obra. Como você enxerga essa questão? E qual seu envolvimento com as artes visuais?
Aquiles: Quando tenho um conceito, sempre penso que essa capa vai estar exposta no meio de um monte de outras capas com dragões, explosões, estátuas, máquinas mortíferas e todas essas coisas.
Por isso sei que precisamos de algo diferente para chamar atenção. Todos os nossos discos (com exceção do Inside your Soul, que é bem metal), têm um apelo visual muito diferente do que se vê no mundo metal e isso também se estende ao nosso site e tudo que geramos de imagem para o Hangar.
“Haunted By Your Ghosts” é a única canção inédita do novo álbum, então, mais do justo a mesma receber o vídeo clipe. O clipe é simples com foco na canção e banda, sem aquelas traquinagens cinematográficas. Há chance da gravação de um DVD em estúdio, sem plateia, a fim de capturar o mesmo clima do vídeo clipe?
Aquiles: A intenção foi exatamente essa! Mostrar que a canção era mais importante do que a imagem… Nós estamos editando o nosso primeiro DVD Acústico que foi gravado em Ijuí/RS, em dezembro do ano passado.
No ano passado foi relançado do álbum, Inside Your Soul, com faixas bônus – o disco fora originalmente lançado em 2001, via Die Hard Records. Há chance de acontecer o mesmo com primeiro álbum, Last Time?
Aquiles: Sim, e já estamos finalizando a capa, que agora será a original mesmo, pois relançamos o Last Time como “Last Time Was Just the Beginning” com DVD e agora vamos ter mais músicas extras que o Mike tinha gravado na época das demos do disco “The Reason of your Conviction”.
Em 2010, você deu vida a sua biografia oficial: “Aquiles Polvo Priester – De Fã a Ídolo”. Você poderia comentar um pouquinho sobre esse lançamento? E o que você viveu nesse ínterim que valeria um capítulo no livro?
Aquiles: É muito bom receber um feedback que a pessoa se inspirou na minha história de vida, que basicamente é a história de um garoto que queria ser baterista de uma banda de heavy metal e foi atrás e continua indo em busca dos seus sonhos.
Sou um cara que conseguiu elevar o nível da bateria do heavy metal dentro e fora do Brasil, tanto em termos musicais como em termos empresariais. Sempre tive o conceito que a música engloba um pacote de coisas que são invisíveis e que não são vistas por quem consome os produtos dos artistas e é isso que cria a magia do encantamento… Tem muitas coisas que já valem outro capítulo no meu livro, mas com certeza essa entrevista ficaria interminável. Acessem o meu site e vejam a minha retrospectiva de 2011 e vejam como um ano pode parecer curto.
O Modern Drummer Festival o convidou no ano passado a ser uma das estrelas do festival. A tradicional revista Modern Drummer Readers Poll o elegeu como o 5° melhor baterista de prog metal do mundo. Qual a sensação de deixar de ser influenciado e passar a ser o influenciador? E qual sensação de ser o primeiro baterista brasileiro de heavy metal a figurar no festival e no ranking da revista?
Aquiles: Surreal! Sempre quis participar do Modern Drummer Festival e também era um grande sonho entrar no ranking mais cobiçado do mundo pelos bateristas. Fico feliz que tenha sido em 2011, que foi um ano que realmente alcancei grande projeção fora do Brasil. Preciso dividir isso com todos os nossos fãs, que são pessoas que nos apoiam incondicionalmente todos os nossos passos.
Como foi a experiência de participar da seleção para integrar um dos ícones do prog metal, o Dream Theater? A torcida por você era grande, mas deu a sensação que sua audição fora um pouco apressada, com os músicos da banda (Dream Theater) fazendo até pouco caso. Procede ou é picuinha minha com os gringos?
Aquiles: De forma alguma. Fui extremamente bem tratado e me senti muito bem por estar entre aqueles monstros da bateria mundial. Isso é uma questão delicada, pois em todo mundo as pessoas me parabenizam por ter sido um dos 7 caras escolhidos a dedo no globo terrestre para substituir Mike Portnoy.
Hoje mantenho contato com quase todos os bateristas e sou grato por fazer parte desse grupo seleto. Ano passado estive em diversos países fazendo workshops e vários fãs do Dream Theater levaram o CD/CD novo para eu autografar, e me diziam que agora eu fazia parte da família da banda.
Isso foi demais, uma sensação incrível. Por outro lado, existem as pessoas que preferem somente criticar. Na verdade, não fui bem mesmo na parte onde eu precisava criar coisas novas em compassos compostos, pois realmente é uma coisa que não faz parte do meu vocabulário, mas tudo bem, isso faz parte da vida.
Fui chamado para a audição pelo que eu já tocava com o Hangar, Freakeys, Angra e Vinnie Moore. Por outro lado, recentemente fui convidado pelo guitarrista Tony MacAlpine para fazer uma tour mundial e vou tocar músicas que foram gravadas pelos bateristas Virgil Donati, Marco Minnemann, Deen Castronovo, Atma Anur, Steve Smith e Mike Terrana.
E fui indicado para o Tony por um membro do Dream Theater… Nada mal, não é? Se o Tony já tocou e gravou com todos esses caras, me sinto muito orgulhoso em representar o Brasil com o cara que fez história na guitarra mundial e que me influenciou com sua música. Sempre fui um grande fã dele.Todos no mundo sabem que existe o cara certo para um trabalho e com certeza eu não era o cara certo para tocar com o Dream Theater.
Segundo eles, o Mike Mangini era e ele está fazendo um excelente trabalho e tem todo o seu mérito. No entanto, a vida musical de todos os outros bateristas vai muito bem, obrigado, ou seja, ninguém se matou e nem parou de tocar por não ter sido escolhido para tocar com a banda.
A vida continua de uma forma ou de outra. O que posso dizer sobre a minha carreira, é que muita coisa boa aconteceu na minha carreira após a audição e tenho certeza que muitas outras coisas boas virão. Sou muito grato a isso.
É um assunto delicado e eu não quero ressuscitar defunto. Mas você mantém algum tipo de contato com os caras do Angra?
Aquiles: Nenhum contato. Quando deixamos de tocar juntos nunca mais falamos sobre nenhum assunto. Nesse meio tempo algumas vezes encontrei o Felipe e o Edu quando o Almah e o Hangar estavam tocando juntos.
O ano está só no começo, o que podemos esperar do Hangar e Aquiles Priester?
Aquiles: Nosso DVD acústico está ficando sensacional e tenho certeza que será um produto de altíssima qualidade. Fora isso, o Hangar participará do Metal Open Air e ficamos muito felizes e orgulhosos por fazer parte do cast.
Como baterista, tenho muitas coisas agendadas em termos de festivais e clínicas de bateria, mas ainda não posso divulgar, pois são datas para o segundo semestre.
Sei que você é colecionador de artigos do Iron Maiden e Coca Cola. Qual o item que você considera mais raro de ambas as coleções?
Aquiles: Tenho um pedaço de uma baqueta do Nicko McBrain, que peguei no show da tour do disco “Fear of the Dark”, em Porto Alegre/1992. Na minha biografia eu comento tudo que aconteceu na minha vida naquele dia e realmente foi um dia muito especial. Da coca-cola, eu tenho uma garrafa que comprei em Taiwan, que reproduzia as primeiras garrafas e paguei uns 200 dólares por essa relíquia.
Muito obrigado pela entrevista, até a próxima!
Aquiles: Eu que agradeço. Nosso show em Volta Redonda me provou uma coisa muito importante. Vi que temos muitos fãs no Rio de Janeiro e a partir de agora, vamos ter que voltar com mais frequência para o Rio.
Por Marcelo Prudente