Uma noite de nostalgia em Porto Alegre, assim podemos começar a narrar o que foi o show de Edu Falaschi no Bar Opinião. Ser imparcial em um texto sobre o Angra é tarefa difícil, o grupo marcou toda uma geração de fãs de heavy metal no Brasil e sempre foi o top 5 entre as bandas de metal para este que vos escreve.
Se o Angra sempre foi um dos grandes nomes do metal brasileiro, o mesmo pode se dizer sobre o tamanho de seus problemas internos. Envolto em trocas de formações e, pelo menos 3 fases bem distintas, o grupo viveu um de seus grandes momentos no início dos anos 2000 com Edu Falaschi como sua voz. Os excelentes álbuns Rebirth e Temple Of Shadows elevaram o grupo a um novo patamar e o levou a anos de bem sucedidas turnês, shows em todos os cantos do mundo e uma nova legião de fãs que se juntou aos mais antigos da fase anterior.
Em Aurora Consurgens, o grupo começou a demonstrar uma queda e, após o mediano Aqua, o grupo passou por nova reformulação. Edu Falaschi acabou saindo da banda e foi se dedicar a seu projeto Almah e a seu trabalho como produtor musical.
Passados alguns anos, Edu se juntou a Aquiles Priester e Fabio Laguna, baterista e tecladista na época do Angra, Diogo Mafra e Raphael Dafras, guitarrista e baixista do Almah, e o guitarrista Roberto Barroso para uma tour em homenagem aos grandes anos do Angra. Inicialmente chamada de The Angra Years, a tour teve que alterar o nome para Rebirth Of Shadows após mais algumas rusgas envolvendo o nome da banda com direito a troca de vídeos entre Edu e Rafael Bittencourt, um dos donos do nome Angra.
Após resolver essa situação, foi a hora de Edu ir para a estrada nessa grande homenagem ao seu período frente ao Angra. Com diversos shows agendados pelo país, Porto Alegre recebeu o grupo no dia 27 de julho, uma agradável noite de quinta-feira, propícia para pura nostalgia aos mais antigos fãs da banda – e de realização aos mais novos – que nunca tiveram a oportunidade de assistir Edu interpretando os clássicos do Angra.
Pouco depois das 21h, o grupo subia ao palco para iniciar a noite de homenagens. A intro Deus Le Volt! anunciava Spread Your Fire, a faixa que abre o clássico Temple Of Shadows foi a escolhida. Além de Edu, as já citadas presenças de Aquiles Priester e Fábio Laguna aumentavam a sensação de ter um quase Angra no palco.
Acid Rain, em seguida, foi a primeira lembrança de Rebirth, álbum de estreia de Edu. “Sai do chão, eu quero ouvir Porto Alegre”, pediu Falaschi. E a resposta veio com a plateia em peso pulando e cantando junto. Edu aproveita os solos para interagir com o público e pedir o grito de todo mundo.
A sequência foi com uma das minhas favoritas e mais subestimadas de Rebirth: Running Alone, que fez a dobradinha do álbum. Edu aproveita para conversar com os presentes: “E aí Porto Alegre! É muito bom estar aqui de volta, vocês não sabem a saudade que eu sinto de vocês, vocês são f***, muito legal”, exclama o vocalista.
Hora de voltar ao conceitual Temple Of Shadows com uma apresentação de respeito. “Eu sei que é quinta-feira, pessoal trabalha amanhã, mas podemos fazer um show longo essa noite?”, pergunta Edu. A resposta é um óbvio e sonoro sim. Então ele avisa: “A gente vai fazer uma música de Temple Of Shadows, ela foi bem significativa pra nós, vamos relembrar e voltar no tempo com Wishing Well”. A balada agrada em cheio os presentes que cantam cada frase junto.
Hunters And Prey (Caça e Caçador), do EP homônimo, levou a plateia as palmas no ritmo dos riffs que misturam alguns elementos da música brasileira. A música, que tem uma versão cantada em português bem popular, na época de seu lançamento, criou curiosidade em saber qual seria apresentada nesta noite. Foi quando Edu começou a cantar que a plateia soube, era Caça e Caçador, a versão traduzida da música, algo bastante curioso mas que funcionou muito bem.
De volta a história de Shadow Hunter vem a clássica Angel’s And Demons. Satisfeito com a resposta do público Edu diz que “não é brincadeira não” e os fãs o ovacionam aos gritos de “Edu, Edu Edu…”, seguido de “Aquiles, Aquiles…”. Fábio Laguna também foi lembrado e teve seu nome gritado por todos.
“Bora fazer mais uma do Rebirth?”, pergunta Edu e Heroes Of Sand foi o hit da vez. Se Edu acabou se afastando do Angra, entre outros, por problemas vocais, uma tour tocando apenas as músicas de sua fase facilita seu trabalho. Os mais críticos vão seguir apontando defeitos, mas Edu deu mostras de estar com boa voz e capacidade de manter um show completo sem maiores problemas.
A turnê é focada em Rebirth e Temple Of Shadows mas Aurora Consurgens foi lembrado através da boa Breaking Ties, um dos poucos destaques do álbum.
Empunhando um violão, Edu diz: “Hoje alguém me mandou uma mensagem nas redes sociais que tava fazendo aniversário, uma menina, ela tá aí?” e após a negativa ele, sem jeito, fala: “Ela não veio né, legal, esquece o que eu ia falar…” para deleite e risada dos presentes. Sempre pedida, Edu interpretou Pegasus Fantasy, a faixa de abertura de Cavaleiros dos Zodíaco, um dos mais populares animes no Brasil. Em uma versão acústica, deu para satisfazer os incessantes pedidos. Ainda no momento acústico, uma homenagem à música brasileira com o grande clássico Trem das Onze de Adoniran Barbosa, cantada pela grande maioria dos presentes que mostraram respeito e conhecimento da cultura nacional.
Edu aproveitou esse momento acústico e pediu ajuda de todos: “Eu preciso muito da voz de vocês agora, vocês vão entender o porquê…” e com o celular em mãos ele filma a plateia e começa a tocar Late Redemption, um dos pontos altos de Temple Of Shadows que conta com a participação do grande Milton Nascimento. E foi justamente na parte de Milton que a plateia deu seu show cantando cada trecho da música.
A banda sai do palco deixando apenas Aquiles para um pesadíssimo e muito técnico solo de bateria. Aquiles dispensa qualquer tipo de apresentação, nascido na África do Sul, cresceu em terras gaúchas e esteve perto de assumir a função de Mike Portnoy no Dream Theater, apenas isso. Durante o solo teve ainda um espaço para ritmos brasileiros, mas sempre soltando o braço e tocando com muito peso. O músico foi ovacionado mais uma vez após os 6 minutos de sua apresentação.
A banda volta ao palco com a veloz Temple Of Hate, uma das mais rápidas e pesadas da banda, que em sua versão original conta com Kai Hansen (Gamma Ray) dividindo os vocais, uma das que mais agitaram os presentes. Bleeding Heart, outra muito popular do EP Hunters And Prey, foi tocada seguida de outra balada, Millenium Sun, de Rebirth.
Edu então vai para a sua maior fala da noite: “Galera, queria muito, muito, agradecer todo mundo que veio assistir a gente na Rebirth of Shadows Tour, muito obrigado. Muito obrigado ao Opinião, ao Marcelo (técnico de som), ao Ricardo da Abstratti Produtora por nos trazer aqui, por ter acreditado nesse projeto. Muita gente nova nunca tinha visto a gente, que bom que temos essa oportunidade de vir aqui em Porto Alegre e mostrar pra vocês, viva o metal brasileiro”. Edu relembrou as passagens que teve na capital gaúcha com o Angra e um fato que sempre chamou sua atenção: “Queria falar um negócio, nunca pedi nada pra vocês, mas agora vou pedir, cantem o hino do Rio Grande do Sul, eu gostaria muito de ouvir isso”. O bairrismo gaúcho falou alto e os presentes atenderam ao pedido enquanto Edu filma tudo e fala que “se um décimo do Brasil fosse que nem vocês o Brasil tava feito”. Há controvérsias prezado Edu, mas não vamos entrar nesse mérito neste texto.
Hora de apresentar a banda aos gaúchos, um a um ele apresenta, com destaque para Roberto Barroso que ao ser anunciado o público grita “Vai Safanão, Vai Safadão…” devido a semelhança do guitarrista com o Wesley Safadão. Edu aproveita para elogiar muito Roberto e seu empenho em tirar todas as notas do virtuosíssimo Kiko Loureiro, hoje no Megadeth. Ao falar de Fabio Laguna, Edu diz: “Esse cara aqui, esse cara é o mais figura que conheci”. Por último falou de Aquiles Priester: “Muito do que está acontecendo nessa tour, muito de ter dado força para viabilizar essa tour veio dessa figura aqui, fico muito feliz em estar de volta em contato com esse cara, um dos maiores bateristas do mundo, esse cara aqui, o grande Aquiles Priester”. Ele passa então o microfone ao “local” Aquiles que diz “quero ser o cantor hoje”. Ele agradeceu os presentes falando: “É uma grande alegria estar de volta a minha querência gaúcha, aqui pode ser a capital de um monte de coisa, mas é a capital do metal, a capital que acolheu a mim e todas as pessoas que amam heavy metal. Sempre que toco aqui no Opinião é especial, toquei aqui em várias vezes e sempre passa um filme pela minha cabeça. Aqui fundei a banda do meu coração, o Hangar e até hoje, não importa o que falem, nós somos uma banda gaúcha, car****. Muita gente não tinha tido a chance de nos ver tocar, e é muito bom por que o metal tá mais vivo do que nunca, vocês estão mostrando isso hoje”.
Aquiles completou falando de Edu: “Quero apresentar o cara que gravou dois dos discos mais importantes do metal mundial. Escreveu mais de 50% das músicas do Angra, o inigualável, o único, Edu Falaschi!”
As falas emocionantes de Edu e Aquiles cessaram para outro grande hit do grupo, “vamos com mais uma de Temple Of Shadows e ela se chama Waiting Silence” anuncia Edu. O EP Hunter And Prey ganha mais uma, a veloz Live And Learn, uma bela oportunidade de assistir essa ao vivo, grande composição da banda que acabou ficando de lado por estar no EP e poucas vezes sido tocada pelo Angra.
“Obrigado a todos, fiquem com Deus, boa noite, valeu” diz Edu, nem ele acreditaria que alguém cairia nessa de se despedir sem tocar os dois maiores clássicos do grupo de sua fase, a plateia apenas esperou que voltassem ao palco e saber qual seria a ordem apresentada.
Poucos minutos depois, o grupo volta para a primeira, o violão no palco indicava a faixa-título de Rebirth, sempre emocionante ao vivo e dessa vez não foi diferente. Do primeiro acorde ao último, a plateia acompanhou cada nota, cada frase, cada mudança, sem dúvida, o grande momento da noite.
A banda sai do palco para os PA´s executarem In Excelsis, prelúdio do outro grande clássico, Nova Era. A faixa que tantas vezes abriu os shows do Angra, a faixa que foi a apresentação de Edu Falaschi ao mundo, dessa vez, ela encerrava uma noite mágica.
Para os fãs do Angra, foi uma noite de muitas memórias e lembranças deixando também o questionamento sobre as tantas dificuldades que o grupo teve em se manter linear durante seus mais de 20 anos. Edu mostrou boa forma e cumpriu com sucesso o grande objetivo da tour, homenagear os seus fãs com o melhor set list possível.